A onda de feminicĂdios ocorridos em pequenos intervalos de dias em Mato Grosso do Sul expõe, mais uma vez, as falhas estruturais do sistema de proteção às mulheres no estado e também nos municĂpios. Em 26 dias 6 mulheres perderam a vida no MS, vĂtimas de seus companheiros, em um dos casos, ocorrido em Caarapó, no sul do estado, a amiga de uma vĂtima foi assassinada.
As histórias contĂȘm requintes de crueldade, disparos à queima-roupa e revelam a brutalidade da violĂȘncia de gĂȘnero, uma crise social que virou, por necessidade, o ponto dos debates do mĂȘs de março no ano de 2025 no MS.
Mais recentemente, repercute também o caso de Cassiane Oviedo, uma menina indĂgena de 14 anos que cometeu suicidio, na trama, hĂĄ suspeita de abuso sexual e consequente gravidez. A mãe da menina luta para fazer uma vaquinha online que pague os custos do enterro. O maior suspeito é o professor de Jiu-Jitsu, preso no inĂcio de março.
O Jornal The Time IndĂgena MS foi uma das poucas mĂdias de Mato Grosso do Sul a repercutir o caso.
Enquanto discursos se multiplicam e campanhas sazonais ganham espaço nas mĂdias, a realidade diĂĄria de milhares de mulheres e meninas continua marcada pelo medo e pela vulnerabilidade. Nas aldeias é ainda mais preocupante.
Falta de acolhimentos ou espaços limitados com procedimentos falhos ou sem procedimentos operacionais mostram, que a pauta estĂĄ extravasando pelos dedos da blindada Segurança PĂșblica de Mato Grosso do Sul. O combate à cultura machista exige uma mudança estrutural que vĂĄ além de ações pontuais.
Governos, polĂcias, redes, sociedade civil, entidades de educação, todos e todas!
Apesar da existĂȘncia de medidas como a Lei Maria da Penha e a criação de Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs), o sistema ainda se mostra ineficiente. Casas LilĂĄs foram criadas em muitos municĂpios, mas a expansão quantitativa, sem muita qualidade, não gera o impacto esperado.
A dificuldade de acesso às medidas protetivas, a falta de casas abrigo, o tempo excessivo de resposta comprometem a eficĂĄcia da proteção. A falta de uma rede, na medida em que muitas mulheres enfrentam burocracias desgastantes para obter amparo. Além da revitimização em processos que deveriam, a princĂpio, garantir acolhimento e segurança.
A impunidade também colabora para perpetuar a violĂȘncia. Muitos agressores jĂĄ possuem histórico de violĂȘncia e continuam em liberdade, mesmo após denĂșncias. Isso gera uma sensação de abandono para as vĂtimas e uma mensagem implĂcita de que o sistema não é capaz de protegĂȘ-las.
A falta de fiscalização sobre o cumprimento das medidas protetivas gera um grande "deixa que eu deixo" com a vida de mulheres que em algum momento sentiram medo de um homem e pediram ajuda do sistema de justiça e das autoridades policiais.
As redes de atendimento à mulher vĂtima de violĂȘncia são um conjunto de serviços, instituições e profissionais que trabalham de forma integrada para oferecer suporte, proteção, acolhimento e orientação para mulheres que estão em situação de violĂȘncia.
As redes envolvem delegacias da mulher, casas-abrigo, assistĂȘncia social (CRAS e CREAS), órgãos de justiça, órgãos do poder executivo como coordenadorias, representações do poder legislativo, todo sistema de saĂșde, OAB e também, membros da sociedade civil organizada, como ONG"s.
A questão é que a falta de regulamentação de polĂticas pĂșblicas em fluxos deixa a dinâmica dispersa, por exemplo, muitos componentes da "rede" não atendem aos finais de semana, perĂodo em que mais ocorrem os casos de violĂȘncia. No fim das contas, a violĂȘncia contra mulheres e meninas fica, em sua grande maioria, a cargo da polĂcia e guardas municipais.
Legisladores e gestores precisam se comunicar e construir atividades normativas que possam "criar a rede de fato e de direito", dando atribuições, mudar planos de cargo, definir fluxos e atribuir responsabilidades fora das reuniões em gabinetes.